quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Japonesas vivem mais, mas ganham menos

Envolverde

Hiroko Taguchi se aposentou em abril, aos 64 anos, de seu trabalho como agente de vendas de seguros, e passou a integrar as fileiras cada vez maiores de mulheres idosas que neste país superam os homens em quantidade nessa faixa etária.


Foto: Divulgação/Internet
Foto: Divulgação/Internet

Tóquio, Japão, 13/12/2012 – Hiroko Taguchi se aposentou em abril, aos 64 anos, de seu trabalho como agente de vendas de seguros, e passou a integrar as fileiras cada vez maiores de mulheres idosas que neste país superam os homens em quantidade nessa faixa etária. Taguchi é divorciada, vive sozinha e depende muito de sua pensão para manter o que, provavelmente, será uma longa vida de aposentada, já que no Japão as mulheres vivem, em média, cerca de sete anos mais do que os homens. Estudo feito este ano pelo Ministério de Saúde e Bem-Estar concluiu que as mulheres representam 87,3% das 50 mil pessoas centenárias do Japão, um recorde.

“Tenho sorte de não ter deixado de trabalhar quando me casei, como era norma para as mulheres da minha geração”, contou Taguchi à IPS. De fato, ela é uma das pouquíssimas japonesas para as quais a velhice não é sinônimo de pobreza e solidão. A maioria de suas contemporâneas, que na juventude ou meia idade trabalharam em tempo parcial ou em casa por tempo integral, agora recebem pensões públicas mensais de somente US$ 500, ou menos, o que basta para apenas atenderem seus gastos.

Uma estrutura social patriarcal que relega às mulheres o papel de cuidadoras e trabalhadoras do lar é amplamente responsável pela situação de vulnerabilidade em que se encontram muitas idosas japonesas.

Segundo dados do governo, 70% das mulheres deixam seus empregos quando formam suas famílias, e voltam a trabalhar – normalmente em tempo parcial – apenas quando os filhos crescem. Este padrão reduz de modo significativo suas possibilidades de obter uma aposentadoria decente. Além disso, o fato de as mulheres viverem cada vez mais significa também que muitas sobrevivem aos maridos e se tornam inteiramente dependentes do sistema de seguridade social do Estado.

Especialistas japoneses afirma que a história de Taguchi é ilustrativa dos diversos problemas enfrentados atualmente pelas mulheres na envelhecida sociedade do país. “Mais mulheres do que homens enfrentam a pobreza em sua velhice”, já que vivem mais e têm menor renda, disse a professora Keiko Higuchi, especialista em populações envelhecidas na Universidade Kasei, de Tóquio, além de assessora do governo para gênero e políticas que afetam os idosos.

O Japão tem atualmente a sociedade de mais rápido envelhecimento do mundo. Os especialistas estimam que, até 2025, mais de 27% da população terá em torno de 65 anos. Também preveem que, continuando as tendências atuais, 40% da população de adultos idosos será de mulheres, que vivem 86,5 anos e os homens 79,6 anos.

Higuchi, que também é uma destacada ativista pelos direitos das mulheres, pressiona há tempos o governo para que elabore políticas que atendam as necessidades das idosas. Entre os muitos problemas que estas mulheres enfrentam estão solidão, maiores probabilidades de ter alguma incapacidade e crescente pobreza, em uma nação que lida com uma enorme dívida pública e que ameaça com maiores cortes nos serviços sociais e na seguridade social.

Estatísticas do Ministério de Saúde e Bem-Estar confirmam este sombrio panorama: 80% dos maiores de 65 anos que vivem sozinhos são mulheres, principalmente divorciadas e viúvas. As mulheres também representam 70% da população dos asilos para idosos, e a pobreza afeta 25% das japonesas de 75 anos, em comparação com os 20% dos homens.

O Ministério também informou que, em 2011, aproximadamente 420 mil mulheres com idades em torno dos 65 anos dependiam da seguridade social, em comparação com 324 mil homens. Segundo a feminista Junko Fukazawa, que aconselha mulheres vítimas de violência doméstica (risco que, segundo ela, é cada vez mais comum para as japonesas idosas que vivem com seus maridos ou filhos), a arraigada discriminação de gênero as deixa ainda mais vulneráveis aos problemas da velhice.

As tradições sociais, que obrigam as mulheres a cuidar da família enquanto os homens trabalham fora, são o motivo principal pelo qual elas “deixam seus trabalhos quando têm filhos” e acabam em “empregos que pagam menos, sofrendo instabilidade financeira” quando se tornam idosas, pontuou Fukazawa à IPS. “A situação é irônica”, acrescentou, dizendo que as tradicionalmente principais cuidadoras de menores e idosos agora estão se convertendo no setor da população que mais apoio precisa.

A necessidade crucial de centrar nas mulheres as políticas nacionais sobre a velhice ganha força no mundo. O informe Envelhecimento no século 21: Uma celebração e um desafio, divulgado em setembro pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), cobra dos governos e de outros atores que prestem atenção à crescente evidência de que as mulheres vivem mais do que os homens, para adaptarem seus planos nacionais a esta realidade. O informe documenta dados de todo o mundo, segundo os quais para cada cem mulheres de 80 anos ou mais há apenas 61 homens.

O envelhecimento no Japão, terceira maior economia do mundo, ilustra alguns destes problemas angustiantes, em um contexto de redução da população que trabalha, e que se espera passará de 80 milhões para 52 milhões até 2050. Para a geração mais jovem de japonesas, que ficam idosas em uma época de austeridade ditada pelo governo e de tentativas desesperadas para reduzir o gasto público, a previsão é alarmante. Esta geração de mulheres já começa a sofrer a pobreza.

Estatísticas do Departamento de Trabalho mostram um aumento do emprego feminino em tempo parcial e de baixo salário, tendência que indica uma erosão na estabilidade das aposentadorias para grande parte da força de trabalho. Para Higuchi, “o atual panorama de envelhecimento mostra claramente que as políticas de crescimento econômico do Japão corroeram os valores familiares tradicionais que protegiam os idosos, e que são particularmente injustas com as mulheres”. Enquanto isso, mulheres como Taguchi se movem com cautela. “Muito consciente de que enfrentaria um futuro de solidão, economizei durante décadas e continuarei economizando. Pelo menos posso evitar a pobreza”, enfatizou. Envolverde/IPS

 

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