O assediado governo sírio de Bashar Al Assad, acusado de preparar armas químicas contra os rebeldes que o combatem, é um dos três do Oriente Médio que rejeitam o convênio internacional para proibir esse tipo de armamento de destruição em massa.
Ataque com gás venenoso contra Halabja, no Curdistão iraquiano 1988. Foto: Sayeed Janbozorgi/ licenç |
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), há oito países (Angola, Birmânia, Egito, Israel, Coreia do Norte, Síria, Somália e Sudão do Sul) que se recusam ou são reticentes à Convenção, também conhecida pela sigla CAQ. Devido a essas resistências, a CAQ não tem caráter universal, ao contrário da maioria dos tratados e das convenções internacionais sobre assuntos-chave.
Interrogado se isto indica que todos, ou a maioria desses oito países, possuem este tipo de armas, o pesquisador John Hart, que dirige o projeto sobre segurança do armamento químico e biológico no Stockholm International Peace Research Institute (Sipri), disse à IPS que há várias razões que explicam a resistência desses Estados. No Oriente Médio, um motivo é o vínculo político construído durante anos por alguns Estados, segundo os quais todos os governos da região deveriam renunciar de modo verificável a todas as armas de destruição em massa, incluindo as nucleares, biológicas e químicas.
De concreto, esses Estados insistem em que todos os países do Oriente Médio deveriam assinar o Tratado de Não Proliferação das Armas Nucleares. Até que a região esteja a ponto de se converter em uma zona livre de armamento atômico, alguns argumentam que é melhor adiar a adoção da CAQ, disse Hart. Mas este argumento perdeu peso nos últimos anos, em parte porque vários países do Oriente Médio se somaram igualmente à CAQ.
Os Estados Unidos afirmam que as armas químicas são uma “linha vermelha” que o governo sírio não deveria cruzar. Em um discurso realizado em uma conferência sobre não proliferação nuclear, no dia 3 em Washington, o presidente Barack Obama disse que o “uso de armamento químico é, e deve ser, totalmente inaceitável. E se alguém comete o trágico erro de usá-lo, haverá consequências diante das quais deverá responder”, afirmou dirigindo-se diretamente a Assad.
A CAQ, cujo cumprimento fica a cargo da Organização para a Proibição das Armas Químicas (Opaq), tem atualmente 188 Estados partes, que representam mais de 98% da população mundial e da indústria química. Em outubro completou 15 anos de vigência, e no mês passado o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu seu vigor universal e exortou os oito reticentes a aderirem à Convenção destinada a eliminar o uso, o desenvolvimento, a produção e a transferência destes perigosos armamentos.
De todo modo, “o uso destas armas é tabu”, disse à IPS o professor George A. Lopez, do Instituto Kroc para Estudos Internacionais sobre a Paz, da Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos. Este tabu “é sustentado com firmeza em todo o mundo e inclusive articulado pelos principais possuidores deste armamento, Estados Unidos e Rússia”, acrescentou. Seu uso tem implicações e ressonâncias que vão além da quantidade de vítimas, sobretudo pelo horror de seus efeitos, disse Lopez.
Quando o então presidente iraquiano Saddam Hussein as utilizou na guerra contra o Irã (1980-1988), a opinião pública do Ocidente se voltou contra Bagdã, embora tenha sido muito pequena a resposta aplicada na época pela comunidade internacional, afirmou Lopez, ex-assessor da ONU e especialista em sanções militares do fórum mundial. “Suspeito que se Assad usar armas químicas vai criar uma justificativa para a intervenção internacional”, ressaltou.
O dano abrasador do agente VX ou de outros gases nervosos que provavelmente a Síria possui poderia alcançar centenas ou milhares de pessoas se fosse lançado do ar, acrescentou Lopez. Segundo a proximidade e a direção dos ventos, os que estiverem perto terão uma morte horrível; uma morte mais lenta atingirá os que estiverem à média distância – e possivelmente tenham acesso limitado a cuidados médicos –, enquanto outros ficarão com cicatrizes por toda a vida e morrerão mais tarde por desordens no sistema imunológico.
Para Hart, outro motivo para não ratificar a CAQ reside nas prioridades políticas. Essas poderiam ser as motivações do Sudão do Sul e da Somália, afirmou. Israel assinou a convenção, participou das reuniões da comissão preparatória para sua entrada em vigor e enviou observadores à conferência anual dos Estados parte. “Isto poderia indicar que, segundo certas considerações geopolíticas amplas, Israel poderia concordar em ratificar a convenção”, segundo Hart.
A Coreia do Norte não responde às tentativas de diálogo da Opaq, o que “obedece às dinâmicas geopolíticas dessa região. Boa parte da discussão sobre as motivações, capacidades e políticas é especulativa”, destacou. Angola participou como Estado observador da conferência das partes, realizada em novembro em Haia. O mesmo ocorreu com a Birmânia.
Há dois anos e meio, houve contatos informais entre a Opaq e a Síria para explorar os parâmetros necessários para que esse país ratificasse a convenção. “Estas ações eram parte das permanentes tentativas da Opaq de conseguir uma adesão universal. A atual instabilidade já tem um efeito negativo nesse processo”, acrescentou Hart. A Síria sofre há 21 meses uma violenta insurgência. Por outro lado, prosseguiu, a União Europeia deu apoio financeiro para promover a implantação efetiva da Opaq. Envolverde/IPS
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